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quarta-feira, junho 29, 2005

Garotos Podres - Entrevista

Os Garotos Podres são sinónimo de mito urbano. Censura, violência, concertos caóticos e hinos proletários, fazem a história da banda Oi! mais importante e mediática do Brasil. O autor desta entrevista acompanhou a tour Ibérica dos Garotos e foi antes do concerto na Corunha que trocou algumas palavras com Mao, o vocalista da banda.

L- Para começar, como surgiu a ideia de formar a banda?
M- Bem, em 82, eu e o Mauro que está desde a formação original, a gente curtia a cena Punk do ABC e tal. Eu já tinha tocado numa banda que era o Sub Mundo que durou pouco menos de um ano, e a ideia inicial era apenas ter o que fazer num sábado à tarde. Encontrar a moçada sábado à tarde para ensaiar em alguma garagem e participar dos festivais de bandas punks que existiam na época e festival de colégio que rolava. A gente não tinha muita pretensão assim de gravar ou tocar profissionalmente ou alguma coisa assim. Então a ideia inicial era essa de ter alguma coisa que fazer sábado à tarde ensaiando com a banda.


Mao
- SP - l985

L- E na altura quais eram as vossas influências não só musicais como também sociais?
M- Então vamos lá, a principal influência da gente é o Punk-Rock do fim dos anos 70 e a Oi! music do começinho dos anos 80, que aliás é o som que a gente curte até hoje. Sob o ponto de vista político a gente estava mais integrado à cena que rolava no Brasil. A gente gostava de Punk-Rock e tal mas era o momento que a gente vivia o final da ditadura militar, a gente morava no ABC onde você tem o ressurgimento do movimento de massas que questiona a ditadura, as grandes greves dos metalúrgicos, surgimento do PT (Partido dos Trabalhadores), da CURTE, aquela coisa toda. Então, as nossas influências musicais é a Europa, basicamente a cena Punk europeia e a Oi! music também, e no Brasil esse período que é o finalzinho da ditadura militar.


São Paulo - 2000

L- Nessa época, e penso que ainda hoje, havia também muita rivalidade e violência entre gangs nos vossos concertos...
M- Infelizmente existe até hoje. Aliás ninguém sabe nem porque é que começou essas brigas... Eu acho que o Brasil infelizmente é um país bastante violento e isso acaba se reproduzindo na cena Oi! e Punk do Brasil. Todo o mundo briga com todo o mundo, em São Paulo isso. Em São Paulo acaba ficando até ruím porque acaba não rolando muitos concertos por conta disso, porque sai briga directo!

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Violência no Brasil - Imagem de Skinheads que atiraram 2 jovens de um comboio em andamento - As camisas das vítimas, que exibiam nomes de bandas de rock, como cólera e ramones teriam motivado a ação dos skinheads

L- No início vocês também tiveram músicas censuradas, como a “Johny”,”Batman”, entre outras. Porque é que isso acontecia no Brasil?
M- No Brasil havia a censura prévia. Havia um departamento da polícia federal que era o Departamento de Censura da Polícia Federal. Então qualquer música que fosse ser gravada tinha que ter aprovação da polícia para poder ser gravada. Tem algumas coisas hilariantes, por exemplo, um grupo de teatro submeteu a peça do Édipo Rei, de Sófocles, a censura federal censuraram e expediram um mandato de prisão para o cara! (risos) Para um cara da Grécia antiga...Então, nós tivemos alguns problemas com a censura, mesmo depois da ditadura, porque a censura ela continuou existindo mesmo até 88, quando a ditadura já havia acabado. Inclusive a última música censurada no Brasil foi “Batman” do nosso 2º LP. O nosso recurso em Brasília foi julgado dia 4 de Outubro, um dia antes de entrar em vigor a nova Constituição em que se abolia a censura. Quer dizer, mesmo assim eles deram um jeito de manter por mais algumas horas a música censurada. Uma coisa que é o reflexo de uma época.

L- E que diferenças notam desses dias para hoje? Só mais ao nível desse tipo de censura?
M- Tem várias coisas, por exemplo, a questão da censura: Antes você tinha a censura oficial. Agora você tem a censura oficiosa. Antes a coisa era às claras. Te colocavam um carimbo no papel censurando a música. Hoje determinadas músicas não tocam nas rádios do mesmo jeito, então acho que é uma censura mais subreptícia...

L- Mais camuflada...
M- Mais camuflada, então na época que nós iniciámos era o finzinho da ditadura militar, a repressão era maior, mas também o nível de politização da juventude era maior. Hoje não há ditadura no Brasil, mas a politização do pessoal jovem eu acho que é menor que na minha época. Na minha época todo o camarada que fosse do movimento estudantil estava engajado mesmo que de uma forma muito superficial no movimento estudantil. Quando era moleque era cara que matava a aula para ir ver greve, só que hoje a moçada não tem tanto engajamento político.

L- Falando ainda desse tempo, das bandas antigas com que começaram e com quem tocavam, continuam a dar-se e a tocar com essas bandas?

M- Sim! Até em Março houve um show muito legal, tipo a gente, Ratos de Porão, Inocentes, etc, no interior de São Paulo, num lugar ao ar livre com 5 mil pessoas, bem legal! Essas bandas punks antigas são pessoas mais ou menos da idade da gente que começaram junto com a gente, que têm mais ou menos o mesmo perfil social e tal, então a gente se dá muito bem com a moçada.

L- A nível de estúdios, material, condições para gravar, têm notado também uma grande evolução?
M- Muita! Antigamente para você gravar qualquer coisa era muito caro! Estúdio caro, a época do vinil era caro para caramba, você mandar prensar 1000 cópias em vinil... hoje essa tecnologia de áudio, de gravação, ela se tornou muito acessível. Então, no Brasil pelo menos, você tem muitos estúdios e bons pelo preço cada vez mais baixo e o CD é mais barato que o vinil cara!

L- Em relação às subculturas do Brasil? Por exemplo, em Portugal como a cena é muito pequena quase toda a gente se dá bem, sejam punks, hardcores, skins, metaleiros, etc. No Brasil também é assim? Nós temos ideia que é uma coisa mais fraccionada...
M- Sim...

L- E qual é a relação dos Garotos Podres com todas essas subculturas?

M- É assim, em São Paulo que é onde a cena é maior, você tem muitos problemas. Então por exemplo, tem pessoal que é punk em São Paulo que tem briga com o pessoal punk do ABC, que tem briga com não sei quem... tem os Carecas do Subúrbio, tem os Carecas do ABC, tem mais não sei quem, surgiu uma secção SHARP e tal... e a gente, sinceramente cara, a gente procura se manter afastado cara, porque é um pé no saco, toda a gente fica brigando com todo o mundo. Saindo de São Paulo é uma maravilha, você sai de São Paulo e vai tocar a qualquer outro sítio, mesmo interior de São Paulo, você vai tocar e tem punk, tem skin, tem cara que não é nada mas curte o som, então é outro clima. Por exemplo, em Curitiba tem pessoal que é skin, tem pessoal que é punk, ninguém briga com ninguém você entende? A gente vai tocar lá, mais de metade do público é cara que não é nada mas ninguém fica olhando feio para ninguém, quer dizer, é muito legal! Agora, em São Paulo há problemas assim grandes, problema de briga mesmo, acho que falta um pouco de politização talvez, não sei.

L- Muitos dos temas de Garotos Podres falam do proletário, dos subúrbios, da classe operária... vocês sentem que são de uma certa maneira a voz ou bandeira dessas pessoas?
M- Eu acredito que sim! Eu acho que a gente reflete um pouco o meio em que nós vivemos. Nós sempre morámos no ABC e a cena no ABC é essa. Tipo, eu agora mudei de casa, mas eu morava na esquina do Sindicato dos Metalúrgicos cara, quando tinha assembleia dos metalúrgicos eu ouvia a assembleia de dentro do meu quarto. Então isso é uma coisa que faz parte do nosso quotidiano, então acho que não podia ser diferente os temas, né?

L- Vocês já tinham estado em Portugal em 1995, a convite penso que da Fast’n’Loud...
M- Isso,isso!

L- Como é que surgiu essa relação com a Fast´n´Loud e a oportunidade de virem cá?
M- Em ’95, um gajo lá do Brasil, o Glauco Mattoso, ele tinha muito contacto com a cena Oi! do mundo inteiro, daí ele tinha contacto com o pessoal do Mata-Ratos e a gente acabou conhecendo o pessoal da Fast´n´Loud e tal e acabámos lançando, participando de algumas colectâneas aqui em Portugal, e a partir daí pintou a oportunidade de a gente fazer uma mini-tourné, 2 shows aqui em Portugal, 8 ou 10 na Alemanha e tivemos um ’95 super legal!


Garotos Podres - Alemanha - l995

L- E lançaram também o split-EP...
M- “Bebedeiras e Miudas”! Junto com Mata-Ratos.

L- E agora 9 anos depois? Notam alguma diferença aqui em Portugal?
M- O problema é que quando você vai tocar acaba ficando muito pouco tempo em cada sítio, então acaba tendo só uma impressão muito superficial dos lugares que você passa. A impressão que eu tenho... eu acho que Portugal em 9 anos... eu acho que tem uma mudança sensível. Talvez essa coisa do Euro, não é, a impressão que eu tenho, eu acho que tem um certo desenvolvimento económico... posso tar enganado. Acho essa questão também dos 30 anos da Revolução dos Cravos, quer dizer, quando nós viemos para cá eram 21 anos apenas. E Portugal começou a ir para a frente depois que se livrou do fascismo, não é? E essa coisa do Euro, eu sinto assim um clima muito interessante por causa dessa coisa, é os 30 anos da Revolução dos Cravos, é a Europa... eu não sei se estou viajando, mas é a impressão que eu tenho, tem um negócio interessante rolando. De qualquer forma, essa questão do desenvolvimento económico de Portugal, apesar de todos os portugueses reclamarem em Portugal, ela é uma coisa patente e visivel, tanto é que você tem a reversão do fluxo migratório, não é? Até à algumas décadas atrás eram os portugueses que saíam de Portugal, agora são pessoas de outros Países que vêm até aqui. Então, acho que realmente esse é um dado que talvez confirme um pouco do que estou falando.

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Garotos Poderes ao Vivo em Portugal

L- Como surgiu a ideia de fazer um tributo a Garotos Podres e posteriormente o convite para os Acromaníacos participarem?
M- Bem, aí o tributo não foi ideia nossa, foi ideia do Português, que é o antigo baterista da gente. Aí o Portugês convidou as bandas e tal, que estavam interessadas, uma delas os Acromaníacos. Os Acromaníacos eu conheço já há 2 anos, eles mandaram um cd deles, o “Qué Lête”, um cd muito bom, muito criativo,tanto é que todo o pessoal que eu mostrei o cd o pessoal adorou o cd de Acromaníacos... daí surgiu o tributo.

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L- E em relação à oportunidade de fazer a edição Europeia deste álbum através da Anti-Corpos?
M- Deixa eu ver, este cd foi o Garotos Podres que bancou inteiro, nós fizémos o papel de gravadora, o sêlo é Garotos Podres digamos assim. Daí, a gente tinha contacto com Hugo Serralha do Acromaníacos, mandámos o cd para ele, ele se interessou, entrou em contacto com a Anti-Corpos e rolou o cd! Espero que o pessoal aqui da Península, de Portugal, Galiza, Espanha e tal goste do cd novo. Garotozil de Podrezepam, medicamento de tarja preta, mas você pode conseguir mesmo sem receita! (risos)

L- Agora mudando de assunto, falando não de Garotos Podres propriamente mas do Brasil, o vosso país de origem. Qual acham que deve ser a solução para o futuro do Brasil? Uma viragem à esquerda, ideologicamente falando, dado que é com a esquerda que se identificam mais?
M- Olha, eu acho que as contradições que você tem no Brasil, que é um país que tem uma diferença social muito grande, uma desigualdade social muito grande, que você tem uma classe dominante extremamente reaccionária, eu acho que infelismente não há saída reformista no Brasil. Reformista que eu digo é tipo social-democrata, eleitoral. Eu penso que a solução para o Brasil é a solução revolucionária, não sei como ela viria. No Brasil realmente é necessário romper as estruturas e destruir o Estado, o aparelho de Estado burguês que se construiu no Brasil ao longo de séculos. Eu acho que enquanto o Brasil continuar com essa estrutura social, com essa estrutura económica, essa subordinação que tem em relação ao FMI e ao poder económico dos Estados Unidos, o Brasil está fardado a perpetuar a miséria. Então, acho que a solução para o Brasil é a revolução.

L- Sei que tens descendência galega e o Capitão Caverna descendência portuguesa...
M- Sim, o pai dele é de Trás-os-Montes...

L- Diz-vos alguma coisa virem tocar às vossas origens?
M- É legal! Nós vamos tocar em Vigo, que foi o porto de onde partiram meus avós para o Brasil!

L- Resta-me perguntar pelos vossos planos para o futuro...
M- Esperamos o ano que vem estarmos a lançar novo álbum, se possível uma nova Tour Ibérica, para tomar muitas garrafas de vinho, muitas Porcas de Murça (risos)... e é isso aí!

L- Ok, obrigado Mao!
M- Um abraço a todos!

Fonte: Dr. Rayban

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